Como combinamos em nosso último encontro, vamos retomar o tema da disciplina positiva para discutir alguns de seus princípios. Se não leu nossa última coluna, você pode acessar o texto aqui para entender melhor como chegamos até esse ponto. Recapitulando resumidamente, a disciplina positiva é uma abordagem que busca uma forma de educar que não seja nem repressiva, nem permissiva e que aposta em ser gentil e firme ao mesmo tempo, desenvolvendo vínculos, respeito e compaixão.
Podemos dizer, ainda, que a principal ferramenta de educação da disciplina positiva é a empatia, a capacidade de entender a perspectiva de outra pessoa. Isso porque é compreendendo as necessidades da criança em cada etapa de seu desenvolvimento que poderemos melhor orientá-la para promover a própria autonomia e para fortalecer a confiança dela em si mesma e em seus pais.
Oito princípios e algumas ferramentas
O site da Attachment Parenting International, organização que busca a difusão da Criação com Apego, traz um resumo dos oito princípios básicos da disciplina positiva. Agora você deve querer saber o que é Criação com Apego, não é? A Criação com Apego visa ao desenvolvimento de laços afetivos fortes entre pais e crianças e encoraja os pais a observarem as necessidades emocionais de seus filhos, a fim de que as crianças se tornem capazes de se relacionar de forma segura, empática, pacífica e duradoura, habilidade que levarão com elas para a fase adulta. E a disciplina positiva é uma das ferramentas de que a Criação com Apego lança mão para atingir esse objetivo.
Vamos então aos oito princípios, como apresentados aqui
- A disciplina positiva começa no nascimento. Os laços de apego e confiança são formados quando os pais atendem consistente e amorosamente às necessidades do bebê, tornando-se a fundação da disciplina.
- A disciplina positiva envolve o uso de técnicas como prevenção, distração e substituição para guiar gentilmente os filhos para longe do perigo.
- Ajude seu filho a explorar com segurança, vendo o mundo através de seus olhos e demonstrando empatia enquanto ele experimenta as consequências naturais de seus atos.
- Tente entender a necessidade por trás de um determinado comportamento do seu filho. Eles, frequentemente, demonstram seus sentimentos por meio do comportamento.
- Resolva os problemas junto, de maneira que a dignidade de todos permaneça intacta.
- Entenda que a etapa de desenvolvimento em que seu filho se encontra é que determina o que será considerado como comportamento apropriado. Adapte amorosamente a maneira como você o guia, levando em conta necessidades e temperamento da criança.
- Os filhos aprendem através de exemplos, então é importante esforçar-se para oferecer um modelo com ações e relacionamentos positivos dentro da família e em interações com outras pessoas.
- Mesmo quando os pais reagem de maneira que sentimentos de tensão, raiva ou mágoa são criados, eles podem reparar quaisquer danos à relação, desde que dediquem tempo para reconectar e pedir desculpas mais tarde.
Esses princípios norteiam a aplicação de uma grande quantidade de técnicas. Vamos dar uma olhada em algumas usadas para fixar limites e normas e fazer com que as crianças os cumpram por meio da comunicação e da confiança.
Crianças aprendem por imitação. Elas se fixam no comportamento dos pais e, por isso, a ideia de “faça o que digo, não faça o que eu faço” simplesmente não funciona. Seu filho não vai aprender a comer sentado à mesa se você pega seu prato e se senta no sofá em frente à TV. Da mesma forma, é muito mais fácil para as crianças passar a seguir os horários da casa se todos os cumprirem, não apenas elas.
Distrair e substituir. A melhor forma de lidar com as birras é chamar a atenção das crianças para outras coisas. Por exemplo, se a criança insiste em mexer em algo que pode quebrar ou que pode feri-la, é mais eficiente distraí-la apresentando outro objeto que chame a atenção dela do que insistir em uma negativa que aumentará o sentimento de frustração. Lembre-se de que, principalmente na fase dos dois anos, a birra é justamente por a criança ainda não ter amadurecido sua capacidade de lidar com essa frustração.
Criticar a ação, não a criança. Se uma criança se comporta mal, não diga a ela que ela é má, diga que aquele comportamento é inadequado e busque, com ela, combinar uma forma de corrigir esse comportamento.
Firmeza com os combinados. Se o comportamento se repetir, é preciso voltar a conversar e reforçar o que foi combinado. “Não foi isso que combinamos” gera mais responsabilidade na criança do que um simples “você não pode fazer isso” e o efeito imediato é o mesmo, evita que ela prossiga com determinado comportamento.
Ajude-a a refletir sobre seus atos. Estimule a criança a pensar sobre as consequências de seus atos e faça com que ela entenda que é responsável por eles. Pergunte, por exemplo, “por que você acha que isso é ruim para você?” e deixe que ela elabore sua própria resposta.
Incentive o bom comportamento. Foque no lado positivo de seu filho, porém, mais uma vez, destacando a ação. “Parabéns, você estudou e tirou boa nota” é melhor do que “você é muito bom e inteligente”. As crianças não são sempre “boas” nem sempre “más”, as ações delas variam entre esses dois polos, então é importante mostrar para elas quando algo que elas fazem é positivo e quando algo é negativo.
Evite os castigos. Há estudos que demonstram que castigos, físicos ou não, têm mais potencial para alimentar sentimentos de ressentimento e rebeldia do que para fortalecer o vínculo de respeito entre pais e filhos. Agressões físicas ou verbais não devem existir na relação de pais e filhos, pois estão vinculadas ao desenvolvimento de transtornos na fase adulta.
Desafio gratificante
A educação é um processo contínuo e, por diversas vezes, aqueles momentos em que acreditamos que estamos progredindo serão seguidos por momentos em que parece que perdemos tudo pelo o que trabalhamos arduamente. Isso pode ser frustrante para os pais, mas, ao menos em minha experiência própria, os resultados a longo prazo são muito gratificantes.
É importante entender que as chaves aqui são a persistência e, principalmente, a consistência com que aplicamos os princípios educacionais com os quais nos comprometermos. De nada adianta estabelecer as regras do jogo, se nós mesmos as quebrarmos. Isso não significa, é claro, que não vai haver ocasiões em que vamos perder a paciência, mas, com diálogo, tudo pode ser remediado. Reconectar-se com a criança e pedir desculpas é fundamental.
Além disso, eventuais erros devem ser vistos como oportunidades para darmos o exemplo de como agir. Se esperamos que as crianças aprendam a reconhecer quando seu comportamento é inadequado e queremos que elas aprendam a tomar atitudes para corrigi-los, nós mesmos também precisamos nos comprometer a fazer o mesmo. É assim que todos aprendem juntos.