(Texto de abril de 2017)
Falar sobre aborto espontâneo é delicado, mas o assunto é mais comum do que pensamos. Aproximadamente 20% das gestações são interrompidas desta forma, mas este número ainda é contestado, uma vez que muitas mulheres acabam abortando sem ao menos saberem que estavam grávida.
Fato é que hoje eu faço parte dessa estatística. E confesso: não é nada fácil!
No final de janeiro descobri que estava grávida e quando a gente vê aquele segundo risquinho na tira do teste de farmácia, o mundo já se transforma. Você já se sente mãe e faz planos. Chora, se emociona, tem medos e uma certeza: um amor sem limites. No meu caso, mais um amor, já que eu tenho a Bia.
Apesar de estar num momento de turbilhões na minha vida, essa gravidez me dava forças e uma esperança que as coisas iriam melhorar. Estava tudo indo (aparentemente) bem. Os enjoos fortes, os hormônios revirando, tudo conforme o cronograma. Com oito semanas a primeira ultra indicou que estava tudo dentro do normal.
E assim se seguiu. Sem nenhum problema visível, continuei a vida, já chegando no fim do primeiro trimestre e na expectativa de um abril mais tranquilo. Mas foi no último dia de março que as coisas se reviraram dentro de mim.
Fui fazer a ultra de 12 semanas, aquela que permite avaliar se o bebê tem algum problema e dá até para chutar o sexo. Eu estava super nervosa. Quando entrei na sala e a médica colocou o aparelho eu já percebi que algo estava errado. Depois de uns longuíssimos dois minutos de tentativa de ver o bebê, ela foi direta: “ele não desenvolveu, está sem batimento” e colocou o coração, sem nenhum som, só aquele vácuo. E uma dor bateu forte. Há mais de três semanas aquele serzinho já não tinha mais vida dentro de mim.
E foi assim, sem sintomas, sem sangramento, sem indício nenhum de que algo estava errado.
Eu, que nunca tinha ouvido falar em aborto retido, saí da sala e chorei feito criança. Não era possível. Eu perdi um filho! Contando isso agora para vocês, as lágrimas que achei que tinham secado voltaram a brotar nos meus olhos. Passei três dias chorando compulsivamente.
No momento da descoberta tinha optado por esperar que saísse naturalmente, mas percebi que seria muito doloroso psicologicamente saber que aquele bebê estava na minha barriga, mas sem vida. Então após uma conversa com minha G.O. resolvi induzir o processo e acabar logo com aquilo.
Não doeu, eu me senti aliviada e pensei que tinha fechado este ciclo. Mas não. A dor física veio e a psicológica não passou. As cólicas não são nada perto da tristeza, mas quando elas apertam a lembrança volta mais forte.
A culpa vem e vai, assim como as memórias daqueles três meses de espera, as conversas com a barriga, as orações, os planejamentos. Tudo interrompido pelo luto.
E eu me dou o direito de chorar, de sentir tristeza, de não entender o que aconteceu. Me permito ficar quieta, calada, sem querer conversar sobre isso ou sobre nada.
Mas ao mesmo tempo eu tenho consciência de que Deus sabe de todas as coisas. E Ele sabe que eu tenho força, assim como todas que passaram por isso, para superar essa fase e tirar todo ensinamento dela. Somos nós que temos que acreditar na nossa capacidade de passar por este ciclo e dar continuidade na nossa vida.
E confesso, fiquei muito mais grudada na Bia, e ela em mim. Ela é meu foco, minha vontade de ficar bem e ser feliz, porque ela quem me traz a alegria que eu as vezes penso que perdi.
Não conto isso aqui para que você tenha medo de que aconteça com você. Mas para que tenhamos compaixão pelas mães que estão sofrendo. E se aconteceu, saiba que você não está sozinha. Saiba que outras mulheres se compadecem com sua dor. E hoje eu te respeito muito mais pela pessoa forte que você se tornou.